segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Lombalgia: Clínica, Radiologia e Correlações




Dor crônica pode ser definida como uma resposta desagradávela a estímulos associados, que surge da lesão tissular real ou potencial. A dor crônica é uma situação sensorial complexa, puramente subjetiva, difícil de ser definida e freqüentemente difícil de ser descrita ou interpretada. Representa uma entidade sensorial múltipla que envolve aspectos emocionais, culturais, ambientais, cognitivos, biológicos e psicossociais. A dor crônica é extensivamente influenciada pela ansiedade, depressão, expectativas do indivíduo e outras variáveis psicológicas.
De acordo com a literatura, os episódios de dor lombar aguda afetam cerca de 70 a 85% da população em algum momento da sua vida. No Brasil, cerca de 10 milhões de brasileiros ficam incapacitados por causa da dor lombar crônica e, no Rio Grande do Sul, observouse prevalência de 4,2% e, tempo médio da duração da dor de 82,6 + 14,5 dias. O pico de incidência é entre a quarta e a quinta década mas, felizmente, apenas entre 4% a 6% dos pacientes tornam-se sintomáticos. Os discos mais acometidos estão entre L4-L5 e L5-S1, sendo que em 95% dos casos a raiz acometida é L5 ou S1. O mecanismo da dor na hérnia de disco provavelmente é multifatorial, envolve estimulação dos terminais nervosos do anel fibroso, compressão direta sobre a raiz e cascata inflamatória química pela exposição do núcleo pulposo.
Em cerca de 85% dos casos não é possível determinar uma causa anatomopatológica precisa ou específica responsável pela lombalgia. Estudos demonstram que a dor pode se originar de muitas estruturas, as principais responsáveis são as lesões musculoesqueléticas, processos degenerativos de disco e facetas. A principal causa de lombociatalgia é a hérnia de disco.
A dor lombar crônica pode ser causada por doenças inflamatórias, degenerativas, neoplásicas, defeitos congênitos, debilidade muscular, predisposição reumática, sinais de degeneração da coluna ou dos discos intervertebrais entre outras. Entretanto, freqüentemente a dor lombar crônica não decorre de doenças específicas, mas sim de um conjunto de causas, como por exemplo, fatores sócio-demográficos, exposições ocorridas nas atividades cotidianas e outros, como índice de massa corpórea (IMC) elevado, fatores genéticos, antropológicos, hábitos posturais, alterações climáticas, modificações de pressão atmosférica e temperatura.
Existe, também, um outro fator causal para essa síndrome dolorosa, sem uma alteração morfológica definida significativa, constituindo um grupo de causa não orgânica, o qual pode ser caracterizado dentro de um contexto psicogênico, remetendo a morbidades psiquiátricas, como depressão, ansiedade e baixa auto-estima.
Clinicamente podemos classificar os pacientes como tendo lombalgia inespecífica, síndrome radicular (ciática ou ciatalgia) ou lombalgia específica (associada a tumores, infecção, fratura ou outras doenças sistêmicas). Lombalgia inespecífica pode ser definida como dor entre a última costela e a prega glútea. Frequentemente se irradia para as nádegas e face posterior das coxas até os joelhos, geralmente com caráter difuso.
Já a lombociatalgia ou ciática se caracteriza por dor lombar intermitente com irradiação por um dermátomo específico de um dos membros em geral até o pé. Tem intensidade maior, aspecto em queimação, choque ou parestesia. É essencial que se busque inicialmente afastar causas específicas para a lombalgia. Devemos prestar atenção nas chamadas “bandeiras vermelhas” do paciente com lombalgia, são elas: início antes dos 20 ou após os 50 anos, perda de peso, referência a trauma significativo, déficit neurológico extenso (envolvendo ambos os membros) e a presença de sinais de doença sistêmica ou infecção.
Com a maior facilidade de acesso à tomografia computadorizada e a ressonância magnética é freqüente que se identifique hérnia ou abaulamento de discos intervertebrais em pacientes com lombalgia crônica. Raramente, no entanto, essas alterações radiológicas são as responsáveis pela dor. Como o paciente com dor lombar é avaliado por vários profissionais com diferentes formações é importante ressaltar que alterações de disco ocorrem com muita freqüência em pacientes assintomáticos.
Sendo a dor lombar crônica extremamente comum, muitas vezes não há correlação entre o achado radiológico e o quadro clínico. Valorizar demasiadamente esses achados radiológicos pode gerar ansiedade no paciente, dificultar o retorno ao trabalho (agravando o impacto social e econômico da doença) e até ocasionar cirurgias desnecessárias.
Outro fator é a falta de conhecimento da semiologia neurológica, o que torna difícil a diferenciação entre os achados acidentais e as alterações radiológicas que realmente se correlacionam com o quadro clínico.
Albuquerque (2008) Avaliou 50 pacientes com lombalgia crônica em vigência de dor e que tinham alterações discais (abaulamento ou hérnia de disco). Buscando, principalmente, identificar sinais semiológicos de ciatalgia e identificar fatores psicológicos e sociais associados. Nenhum dos 50 pacientes apresentava sinais clínicos de ciatalgia. A alteração radiológica mais comum foi hérnia de disco (46% dos casos) seguida por abaulamento (42%). Depressão estava presente em 25,52% e havia referência a benefício previdenciário em 80,43%.
Concluio que não havia correlação direta ou preponderante entre hérnia ou abaulamento de disco e a lombalgia crônica referida nos casos estudados. Nós acreditamos que está havendo uma supervalorização dos exames de imagem em detrimento de uma adequada avaliação clínica dos pacientes com lombalgia crônica sem ciática.


REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, A. V. Lombalgia crônica sem ciatalgia: correlação entre o quadro clínico e a radiologia. Rev Neurocienc 2008;16/3: 184-188.
COSTA, F.L. et al. Avaliação fisioterápica da lombalgia crônica orgânica e não orgânica. COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)191-200.